sábado, 24 de setembro de 2016

A Roda

Nina acordou o cheirinho do café no quarto, abriu os olhos, virou-se e viu Heitor perto da mesa de café. Lembrou-se do retorno ao Brasil, da chegada ao porto com a recepção de seus pais, Dona Júlia e Dr. Luiz, que partiram após o jantar. Heitor preferiu que ficassem hospedados em um Hotel para seguir viagem pela manhã do dia seguinte.
Ele virou-se com a bandeja nas mãos e surpreendeu-se com seus olhos a observá-lo.

"_ Bom dia! Dormiu bem? "Perguntou ele com aquele sorriso maravilhoso.

"_Sim, muito bem!" Respondeu-lhe enquanto ele colocava a bandeja em seu colo.  "_Mas.. que gentileza amor, a tantos anos não sou servida na cama. Alias, desde que sai da casa de meus pais, somente Geralda me serviu na primeira manhã na casa de campo do Dr. Luiz." 

"_ Você merece Nina, queria fazer-te uma surpresa, mas quando vi já estava com os olhos arregalados." explicou-lhe Heitor animado.

"_ Meu amor, sou tão grata a Deus por tê-lo ao meu lado, és um presente em minha vida!" Confessou a ele com a voz embargada. Percebendo sua sensibilidade Heitor desconversou!

"_Muito bem minha querida, tome seu café para partirmos, se não houver imprevistos estaremos em casa ao anoitecer, a viagem é puxada!" Ele falou tocando-lhe o rosto com carinho.

Já estavam perto da fazenda quando a carruagem parou. O cocheiro avisou-os que havia uma árvore bloqueando a passagem, Heitor desceu e ambos foram retirá-la do caminho, Nina esperava na carruagem, a árvore não era muito grande e a retiraram com facilidade.

"_ Vamos seguir!" Ordenou ao cocheiro, entrando na carruagem e ajeitando-se ao lado de Nina. Pouco depois de reiniciarem a viagem, passaram em frente a uma grande casa.

"_Heitor Olhe!" Nina chamou-lhe a atenção para uma pessoa toda coberta, que se dirigia ao casarão, ambos ficaram observando, virão a pessoa aproximar-se de um tambor embutido na parede, colocou dentro dele algo enrolado em uma mantilha, bateu o sino de aviso e saiu rapidamente escondendo o rosto, não saberiam dizer se seria homem ou mulher, pois a capa cobria-lhe até a cabeça.
Eles se olharam calados,  Heitor comentou com um suspiro de desaprovação:

"_É a * Roda dos enjeitados Nina."

Nina Já havia ouvido falar sobre a roda dos enjeitados, até sabia como funcionava, mas nunca aprofundou-se nos pensamentos pois a faziam sofrer. 
Chocou-se ao presenciar aquele ato e saber que uma criança estava sendo deixada, abandonada em um"tambor" enquanto ela havia muito desejado ter podido ser mãe. 

"_ Esta pessoa colocou uma criança lá Heitor! Rejeitou um bebê, sangue do seu sangue, como pôde fazer isso?"  Ela falou, percebia-se grande tristeza em seu comentário. Heitor pegando-lhe a mão carinhosamente, lamentou.

"_Infelizmente minha querida, não posso explicar-te o que leva alguém a fazer isso. Na maioria das vezes não é a mãe que a traz aqui, mas um empregado ou até mesmo a parteira a mando de alguém que por algum motivo não quer a criança por perto. Me perdoe querida,  não há outro caminho para chegarmos a fazenda. Sinto muito por isso! Sei que trouxe-lhe desagradáveis lembranças minha Nina!"

Ela enxugou discretamente uma lágrima, não queria que Heitor a visse chorando, além do mais seria está a primeira noite de casados em casa depois de dois meses em Lua de mel. Respirou profundamente e virando para ele deu um discreto sorriso e falou tentando esquecer o acontecido.

"_ Pronto, passou! Não poderei fugir de tudo que me lembrar meu passado meu anjo. Esqueçamos isso! Não vejo a hora de chegarmos em casa!"

Heitor devolveu-lhe o sorriso, admirava a forma com que Nina se recuperava dos altos e baixos que a vida lhe colocava, apesar de sua aparência delicada e frágil, era sim uma mulher forte!

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*A roda dos enjeitados consistia num mecanismo utilizado para abandonar (expor ou enjeitar na linguagem da época) recém-nascidos que ficavam ao cuidado de instituições de caridade. O mecanismo, em forma de tambor ou portinhola giratória, embutido numa parede, era construído de tal forma que aquele que expunha a criança não era visto por aquele que a recebia.As primeiras Santas Casas de Misericórdia da América Portuguesa que receberem a roda dos expostos foram as de Salvador (1726) e a do Rio de Janeiro (1738).

Fonte de pesquisa: wikipedia









3 comentários:

  1. Que casal apaixonante, que convivência harmoniosa, tão cheia de amor, carinho, cuidado, tudo descrito de forma simples e sofisticada ao mesmo tempo;me sinto parte da estória.Muito linda.

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    1. Nice, minha querida, como agradecê-la por seu carinho em ler e comentar meus escritos. Muito obrigada mesmo minha linda. Beijos

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    2. Nice, minha querida, como agradecê-la por seu carinho em ler e comentar meus escritos. Muito obrigada mesmo minha linda. Beijos

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